Nos
últimos dias recebi alguns questionamentos sobre minha
posição manifesta sobre estes termos, mais exata
e metaforicamente, "fenômenos" do automobilismo.
Assim, decidi tentar explica-los de forma mais clara, dentro
do possível, e deixar claro que minha restrição
é somente em relação aos dois últimos.
A forma mais direta que encontrei foi fazer uma analogia entre
os regimes de governo e suas distorções. Mais
ou menos aquela estória de democracia que vira anarquia
ou tirania dependendo da direção errada que seguir.
Monomarca, quando se refere a uma categoria, além da
óbvia exclusividade de uma marca, representa, ou deve
representar, um equilíbrio básico entre os competidores
usando equipamentos os mais similares possíveis, propiciando
àqueles mais talentosos a possibilidade de mostrar seu
valor. Basicamente, a diferença entre eles, além
das ligadas ao talento natural de cada um para guiar, deve estar
na capacidade deles de acertar o seu equipamento da forma mais
adequada para o dia e local da prova.O custo inicial pode variar,
porém, deveria ser próximo entre todos os competidores
da categoria em questão. Mais ou menos o que acontece
na comparação de custos para se fazer a Copa Corsa,
a Copa Clio e a Stock Cars V-8. Vai de "um pouco"
até "um monte" de grana a diferença
entre as categorias. Mas, dentre os que participam em cada uma
delas, os custos dever ser próximos. Ressalvo que não
estou discutindo a qualidade de cada uma e seus retornos publicitários.
Só a questão do investimento inicial em muito
diferente entre elas.
As distorções das categorias monomarcas têm
sido manifestadas, basicamente, de duas formas: o regulamento
formatado, mais exatamente de suas falhas e possíveis
más-interpretações, voluntárias
ou não, e, através da constante elevação
dos custos iniciais a título de uma propagada evolução
tecnológica, ligada ou não à segurança.
A primeira é o reflexo do esmero dos organizadores ao
formatar o regulamento para evitar, desde o princípio,
que o certame tenha um vencedor que, voluntariamente ou não,
utilize recursos que distorçam a finalidade prevista
de "se fazer a diferença no braço".
Quanto mais esmerado o regulamento mais se pode deduzir que
a violação do mesmo seja voluntária e se
aplicar uma punição exemplar que, por fim, reflete
na própria credibilidade da categoria e de seu "comissariado".
No entanto, poucas são as punições que
podem ser consideradas "exemplares" em nosso país.
Há muita "manobra legal", "recurso à
Justiça comum", etc, colocando a credibilidade do
evento em xeque no momento em que se declara um vencedor de
etapa ou de campeonato que não se tem certeza se será
mantido após algum tempo. A que considero mais efetiva
vem dos certames da Granja Viana, do kart, que aplica não
só suspensão aos pilotos com perda de pontos mas,
também, estende a punição à multas
e aos preparadores.
A última, a dos custos, caracteriza uma das faces da
"exclusão pelo custo", ou seja, quando as regras
são alteradas com impacto negativo sobre os custos. Historicamente
quando alguns dos "talentosos" começam a se
destacar, desbancando regularmente os principais favoritos,
as regras são alteradas sob o argumento da evolução.
Enquanto a categoria apresenta baixos custos ou os custos inicialmente
previstos muitos "andam no bolo da frente" e "têm
chances de vencer". Depois, com a alteração
das regras, começam a "andar para trás"
por não poderem acompanhar o custo "revisto"
que só favorece aos mais "endinheirados", independente
de seus talentos. Há exemplos clássicos e flagrantes
na História e na atualidade. Desde o Kartismo até
a Fórmula -1. Porém estas são categorias
"multimarcas". No caso das monomarcas tivemos exemplos
na extinta Copa Fiat e, por não haver limitação
quanto ao número de jogos de pneus que possam ser utilizados
para uma prova, já se manifesta na Copa Clio. A Copa
Fiat,inicialmente, tinha carros basicamente originais. Era um
sucesso. Como sucesso, atraiu muitas "estrelas consagradas".
Quando as "estrelas consagradas" passaram a ser efetivamente
ameaçadas por "estrelas em ascensão"
as regras começaram a mudar. Foram introduzidos pneus
slick, logo a seguir ou conjuntamente os blocantes. Depois,
dividiu-se em "A" e "B"... Até que
a categoria se tornou inviável. Não havia como
depreciar os custos de aquisição de tais materiais
e "as estrelas se foram". O prejuízo foi grande
a ponto de determinar a "extinção" do
campeonato. Sem dúvida há uma série de
outros fatos que contribuíram para tal destino, porém,
na minha opinião estes foram os mais relevantes pontos
comuns em situações deste tipo.
Monomarquismo, um termo inventado, é a distorção
que afeta uma categoria multimarca que, por privilegiar demasiadamente
uma, acaba por determinar o afastamento das outras marcas. Aconteceu,
por exemplo, no extinto "Brasileiro de Marcas" e nos
Rallyes afeta algumas categorias do Grupo N. De forma mais proeminente
a N4, onde em condições "absolutamente normais"
a Mitsubishi, com seu Lancer Evolution a cada ano aperfeiçoado,
não tem como ser derrotada. Não há produto
de sua classe que "originariamente", com a configuração
básica colocada à disposição do
"consumidor comum", possa confronta-la. Teoricamente,
haveria maior equilíbrio até. Porém, há
uma "equipe oficial de fábrica" contra os "particulares"
que nunca irão dispor dos mesmos recursos tecnológicos
mesmo que disponham de dinheiro para compra-los. Como, de alguma
forma, a Subaru consegue com sua equipe oficial equilibrar a
luta com a Mitsubishi oficial, esta se vê obrigada a continuar
para não "pagar o mico" de se ver derrotada
por um veículo "originariamente" limitado.
Em contrapartida, mesmo vencendo a "disputa oficial",
a Subaru conseguirá persuadir um piloto privado a entrar
na disputa com sua marca. Todos, fora a exceção
que confirma a regra, que dispõem dos recursos para comprar
um Evo assim o fizeram. O "grid" da N4 no Brasil e
no mundo é fato e, como contra fatos não há
argumentos.
Dadas as definições, reitero que considero a estratégia
de campeonato monomarca válida assim como a de multimarca.
Tudo depende de quem faz e como faz. O que vem no "pacote".
Ter uma fábrica "avalizando" um campeonato
é sempre algo positivo na hora em que se buscam patrocinadores
quer como competidor quer como organizador. Portanto, sou um
determinado oponente apenas às distorções
que, por fim, fazem com que nosso esporte perca sua credibilidade
e custe mais do que o justo na relação investimento
- retorno. Isto, por sua vez, afeta diretamente a relação
com patrocinadores e o volume de competidores, formando o chamado
"ciclo vicioso" ao invés do "clico virtuoso"
que poderia surgir.
Memória
frágil
Desde o ocorrido no GP da Áustria tenho sido surpreendido
com a veemência de alguns jornalistas em suas críticas
aos membros da Equipe Ferrari. Os mais novos em sua carência
de um novo Senna, se esquecem das vezes em que Bergher beneficiou
Ayrton, a ponto de receber deste uma vitória de mão
beijada no Japão como forma de agradecimento pela ajuda
dada e que tinha influência na disputa de posições
intermediárias da tabela do campeonato. Porém,
fiquei mais surpreso com alguns artigos dos jornalistas mais
antigos que só não xingaram explicitamente às
mães dos personagens envolvidos. No mais, rolou de tudo
um pouco...
Tenho certeza que todos eles presenciaram, direta ou indiretamente,
diversas situações em distintas categorias pelo
mundo afora e aqui, semelhantes à ocorrida na Áustria.
Mas, lembro-me de alguns deles como críticos severos
de Emerson Fittipaldi quando ficou claro que a Equipe Copersucar
de Fórmula -1 teria um destino semelhante ao ocorrido
á equipe Prost mais recentemente. Diziam, à época,
que a decisão de Emerson havia sido precipitada e emocional,
que um piloto de sua categoria não poderia ter deixado
á McLaren naquele momento e se lançado numa aventura,
etc...Por fim, até renascer na Indy, Emerson estava "acabado",
independente de seu bicampeonato mundial conquistado. Mais,
na temporada de 1973, a dupla da Tyrrell formada por Jackie
Stewart, já bicampeão de F-1, e François
Cevert, um excelente segundo piloto segundo muitos destes mesmos
jornalistas, usaram e abusaram do mesmo procedimento de inversão
em favor do primeiro piloto e, no final, Stewart sagrou-se tricampeão
naquele ano. E muitas outras vezes este procedimento foi realizado
sem que alguns dos, atuais, críticos escrevessem uma
só linha de censura.
O elo da situação está no fato de se instigar
a desobediência de um piloto profissional que, até
renascer na Ferrari, foi motivo de chacota por parte de jornalistas,
programas de televisão, etc, ao qual foi atribuída
a "herança" de substituir Senna independente
de sua vontade. Naquele fatídico final de semana de 1994,
em Ímola, na Sexta-feira, aquele "garoto" que
chamavam de Rubinho, gastou o último pedaço de
sorte que pairava sobre o autódromo. Depois dele, todos
os que se envolveram em acidentes foram feridos de forma grave
e até letal. Morreu Ratzemberger no treino de Sábado.
Lamis teve as pernas quebradas na largada. Senna faleceu fisicamente
logo após a liberação da pista. Mais, em
Mônaco, na prova seguinte, Karl Wendlinger entrou em coma
após bater na saída do túnel. Portanto,
seria compreensível que o "garoto" levasse
algum tempo para voltar ao topo. A mesma compreensão
que tiveram com Piquet quando, também em Ímola,
se arrebentou com a Williams no muro da Tamburello e disse que
ficou um ano sem dormir direito e precisou de dois anos para
voltar a guiar no mesmo ritmo. Bergher na Ferrari, no mesmo
lugar, quase assou no carro em chamas e todos acharam natural
que ele levasse algum tempo para se recuperar psicologicamente.
Barrichello não foi premiado com a mesma compreensão
e sempre foi muito cobrado. A imprensa e o público jamais
lhe deram trégua. Agora que ele demonstra maturidade
e profissionalismo, ao mesmo tempo está em excelente
forma técnica e emocional, a imprensa e o público
voltam a cobrar dele algo que deveria ser mais bem compreendido.Reitero
que considerei que a forma como Barrichello cedeu a posição
foi o maior complicador e algo próximo à desobediência
instigada. Mas, diante da atual posição do piloto
e do próprio país no cenário da F-1, não
vejo qualquer outra opção a não ser seguir
rigorosamente às ordens da equipe que lhe é capaz
de fornecer o melhor equipamento da categoria e de fortalecer
sua posição como, senão o único,
um dos únicos em condições de ameaçar
regularmente à supremacia de Michael, senão no
campeonato, ao menos em algumas provas. Respeitoso do grande
cabedal dos críticos cabe-me somente deduzir que muitos
deles foram traídos pela memória frágil.
A
contrapartida...
Escrevendo sobre o assunto acima, deparei-me com aqueles ditados
que dizem: "a exceção justifica a regra";
"o futuro a Deus pertence" e "nada acontece por
acaso" e outros do tipo.
Helio Castro Neves venceu pela segunda vez as 500 milhas de
Indianápolis. Com isso, igualou-se a Emerson Fittipaldi
que era seu "manager" até poucas temporadas
atrás.
Na última temporada sob a orientação de
Emerson, Helinho quase ficou sem carro para guiar no final da
temporada. O rolo de Emerson com o dono da equipe de Helinho
foi dos grandes e eu, que estava correndo e testando nos Estados
Unidos, á época, fui telespectador do outro lado
da história, segundo o americano...Coisa estranha! Muito
estranha! Deixa para lá! No final do prazo dado para
que Emerso aparecesse com o patrocinador o adquirisse parte
da equipe, sem que nenhuma das duas coisas tivesse acontecido,
o americano deu por encerrada a equipe. Helinho ia ficar a pé,
então, brigou com Emerson e "se ofereceu" à
Roger Penske que já havia contratado Gil de Ferran e
Greg Moore. Porém, Moore, que havia "decretado"
o fim da carreira de Emerson ao "prega-lo" no muro
de um oval, se não estou enganado de Michigan, faleceu
num acidente na última prova do ano por sua "antiga"
equipe, abrindo uma vaga na Penske. Emerson "falou um monte"
mas, não provou...Desde então Helinho tem se firmado
como um dos mais rápidos e respeitáveis pilotos
da CART e, agora, da IRL. Tivesse ele seguido naquele momento
as orientações de seu " manager" e,
muito provavelmente, teríamos deixado de compartilhar
este e muitos outros feitos deste grande piloto brasileiro com
apelido de Homem Aranha. Agora é só não
se enrolar na própria teia que o sucesso e o reconhecimento
de sua carreira o guiarão a mais sucessos. Mais, se fosse
a metade do que Emerson falou Helinho já teria ficado
sem carro. Ao contrário, seu contrato foi renovado com
a equipe, ao lado de De Ferran, sob "sorrisos" do
Mr. Penske. Olha que isto foi antes desta segunda vitória
em dois anos consecutivos. Algo que nem o Emerson conseguiu
e que torna o feito de Helinho único por aqui e raro
mesmo nas terras do Tio Sam. Valeu Helinho!
Até a próxima!
As
opiniões desta coluna são de responsabilidade exclusiva
do autor
Cacá Rabello